O pior de tudo é que tenho que concordar um pouco com a crítica. O perfil da ATEA no Facebook (associação da qual apoio e sou membro pagador) costuma replicar depoimentos, a maioria de adolescentes, sobre sua descoberta do ateísmo, e suas revoltas para com os pais, em geral. Não que eu não concorde que devemos lutar contra a alienação de muitas religiões. Mas é difícil ler depoimentos de pré-adolescentes afirmando que são ateus desde criança. Tem algo estranho ai. É como tentar admirar a poesia de uma criança: Você acha bonitinho, mas sabe que a criança não tem profundidade de sentimentos e experiências para tornar o texto sincero.
Ateísmo não é religião, e nem mesmo é um pensamento uniforme. E por isso não tem um guia, um livro ou um líder O que temos são personalidades, algumas bem agressivas (como Dawkins), outras mais pacatas (como Botton), além da sempre comum lista de celebridades, como Angelina Jolie, Brad Pit, Charles Chaplin, Darwin, Voltaire, Einstein, etc. São muitos pensamentos diferentes para serem defendidos com fervor. Alias, fervor é uma palavra que combina muito mais com fé do que com dúvida (a base de todo o pensamento ateu ou agnóstico).
Como nasce um ateu?
Antes de ser um ateu, uma pessoa deve ser cientista. Deve se perguntar das coisas, e usar o conhecimento acumulado para tentar derivar respostas. Felizmente todos nós viramos cientistas quando temos 4 anos! É a época dos 'porques', que tanto dificultam a vida de certos pais. Lembro que, quando criança, havia formulado a hipótese de que as ondas do mar eram feitas pelas baleias, pois o 'vento' (a explicação standard da escola) não me satisfazia. Afinal eu não conseguia fazer ondas similares às do mar soprando em um balde. O que é isso, senão o método científico? Tinha uma explicação 'goela abaixo' não satisfatória, tinha um experimento em escala (o balde!) e tinha uma hipótese. Obviamente estava errado, até o dia em que entendi as correntes marinhas derivadas da evaporação do mar, com consequência o vento.Com o tempo os adultos vão
Então: Não creio que possa existir um pré-adolescente ateu porque as explicações do mundo são muito complexas para essa idade. E se ele se diz ateu, é porque está crendo de que aquele pensamento é o correto. E crer é exatamente o que um ateu não deve fazer!
Religião para Ateus!? Pode isso, Arnaldo?
![]() |
Religião para Ateus, de Alain de Botton |
Olha, a regra é clara: Ateísmo não é religião. Mas o filósofo Alain de Botton fez um trabalho muito bom ao mostrar a importância de vários elementos da religião para a sociedade.
Um exemplo dele critica as universidades: Estas não criam cidadãos melhores, e sim pessoas com uma expertise em uma área. Você não sai um ser humano melhor da Universidade (se não era bom antes, talvez saia até pior!). A igreja te-o-ri-ca-men-te traz valores e rituais que deveriam engrandecer o zeitgeist. Na visão do autor, então, parte da experiência universitária deveria ser enriquecida com mais filosofia, sociologia, etc.
A questão dos rituais, eu sei, geram um frio na espinha de muita gente. Porém, ao retirar-se a capa de religiosidade da palavra, os rituais são marcos na vida, e são importantes para assentar evoluções da pessoa. Cerimonias como casamentos, aniversários, formaturas, bar mitzvah's e festas de 15 anos, todos são marcos que tornam nossa vida menos monótona e com um sentido a mais de realização. Mesmo ritualísticas mais comuns, como missas, cultos e datas festivas como o natal teriam como benefício uma forma de reencontro com seus próximos, e um obrigatório reencontro com seus valores, em tese.
O livro tem partes que fariam Darwin se remexer no túmulo, mas ainda assim é uma leitura válida. Ele ajuda a questionar certos 'ditos populares', repetidos à exaustidão por nós colegas ateus e agnósticos contra as investidas dos religiosos. E se você é ateu mesmo, não pode deixar nunca de ler algo que possa mudar sua forma de pensar, não é mesmo!?